
A Delegacia de Homicídios – DH da Polícia Civil de Chapecó finalizou a investigação sobre a morte de Valter de Vargas Aita, vítima de violento homicídio ocorrido em 7 de setembro de 2025.
Conforme ampla repercussão do caso nos dias que se seguiram ao crime, o corpo da vítima foi encontrado caído completamente nu e totalmente ensanguentado na escada do prédio onde ele morava, localizado no centro de Chapecó.
A investigação teve início imediatamente com diversas diligências policiais e periciais, sendo que nos mais de vinte dias que se seguiram ao fato foram ouvidas várias testemunhas e analisados elementos de prova obtidos de forma técnica. A conclusão da investigação aponta sem sombra de dúvida a prática de crime de homicídio doloso com duas qualificadoras, quais sejam: motivo fútil e dificuldade de defesa da vítima.
As constatações decorrentes do exame do cadáver (exame de necropsia), do exame de lesão corporal na autora, da perícia na arma do crime e do exame do local do crime demonstram de forma cabal que Valer de Vargas Aita foi morto com múltiplos golpes de arma branca do tipo faca (uma faca de cozinha grande tradicional – foto), bem como rechaçam qualquer possibilidade de legítima defesa no caso.
O conjunto de provas evidencia a dinâmica do homicídio, durante o qual a vítima foi surpreendida com uma facada na região pescoço com profunda penetração na região jugular, a qual se seguiu de diversos outros golpes na região da nuca, cabeça, rosto, braços, pernas, tórax (estes com provocação de hemopneumotórax), bem como na região do abdômen (neste último caso inclusive com exposição de vísceras em virtude de corte profundo).
Tudo indica que a primeira facada na região jugular (já mortal) foi desferida de surpresa, enquanto a vítima ainda estava acordando, inviabilizando qualquer possibilidade de defesa inicial, mesmo para um homem com porte físico atlético e significativamente maior que a ofensora.
Ao menos três dos mais de dez ferimentos decorrentes do esfaqueamento podem ser considerados “potencialmente letais”, ou seja, cada um deles poderia ter causado a morte da vítima por si só, independentemente do advento de outros golpes.
O exame médico no cadáver revelou lesões decorrentes de arranhadura e mordedura humana, assim como vários cortes nas palmas e partes internas das mãos, o que evidencia que por diversas vezes a vítima tentou segurar a faca pela lâmina enquanto estava sendo violentamente golpeado.
Por sua vez, o exame médico realizado no corpo da autora apontou lesões bastante levianas, sendo algumas poucas escoriações na cabeça e destaque para um corte em uma das mãos, cuja dinâmica do delito evidencia ter ocorrido durante um dos golpes desferidos contra o companheiro, haja vista que a faca não tinha bainha e a mão da autora deslizou pela lâmina diante da resistência no objeto após a penetração da lâmina.
Outrossim, a investigação ainda concluiu que a vítima tentou fugir do apartamento do casal mesmo já mortalmente ferido, deixando rastros de sangue pelos corredores e pela escada do prédio. Neste momento, foi visto por uma testemunha com o rosto aparentemente intacto. Esse detalhe sugere que, após ter caído e desmaiado na escada onde foi encontrado, o homem ainda foi ferido por diversos golpes perfurantes no rosto, num claro indicativo não apenas do “animus necandi” da autora, mas do seu intuito de expiar a raiva que estava sentindo do companheiro.
A testemunha mais próxima do fato ainda afirmou que nunca ouviu brigas entre o casal (apenas do isolamento acústico ruim do prédio), bem como não ouviu qualquer discussão no momento do crime, mas apenas apelos da vítima por socorro e, já no corredor, sua demonstração de surpresa e perplexidade diante do ataque da esposa: “meu Deus, por que você está fazendo isso?!”, alegou ter ouvido.
No tocante à motivação do homicídio, a equipe de investigação conseguiu obter elementos técnicos, inclusive diálogos de texto mantidos pela autora com uma amiga e vídeos feitos por ela, os quais comprovam de forma clara que o crime foi praticado por ciúmes. A autora acreditava que o companheiro estava se relacionando sexualmente com outras pessoas já há alguns meses antes do crime e por mais de uma vez deixou claro seu desejo de matá-lo por isso.
Além do próprio interrogatório da autora, que confirmou essa situação conjugal, a investigação descobriu um vídeo feito por ela durante uma tentativa de “flagrar” o companheiro sorrateiramente. A autora descobriu (ou fabricou) pequenos buracos na parede do quarto e, a partir de outro cômodo do apartamento, passou a monitorar o companheiro enquanto ele estava sozinho no recinto manuseando seu aparelho celular. Tudo indica que esse monitoramento clandestino tenha perdurado por algum tempo antes do crime.
Nada obstante, gravações feitas pela própria autora e mensagens de áudio trocadas entre o casal revelam ameaças anteriores a exemplo de: “ele vai pagar pelo que estava fazendo comigo” e afirmações da vítima no sentido de que não se submeteria à ameaça de “levar facadas” por parte da companheira.
A investigação descobriu fotos feitas pela autora da vítima dormindo em dias anteriores ao crime, uma das quais ela enviou ao marido com o intuito de fazê-lo saber sobre sua vigilância constante. Além disso, em diversas mensagens de texto encaminhada para a vítima nas semanas que antecederam o delito ficam evidentes ameaças, inclusive algumas finalizadas com emojis de facas. Em uma dessas ocasiões, a vítima chegou a afirmar que “se algo acontecesse” (sua morte), deixaria uma “carta” de antemão informando que seria a autora a responsável.
Interações da autora com uma inteligência artificial recuperadas também evidenciam que seu estado de ânimo bastante alterado e seu descontrole e frustração em relação à suposta infidelidade conjugal do marido.
Algumas testemunhas próximas da vítima revelaram que o casal já estava junto há alguns anos e se casaram formalmente em 2021, sendo que nesse período o comportamento da investigada sempre foi muito estranho, inclusive com manifestações explícitas de que poderia matar o companheiro. Segundo descoberto, em certa ocasião a vítima relatou para familiares ameaças de morte proferidas pela esposa. Outrossim, também ficou evidente que o casal vivia de forma bastante discreta para não tornar pública a convivência em Chapecó, eis que nem mesmo alguns vizinhos e amigos próximos sabiam que a autora morava com a vítima no apartamento onde o delito ocorreu, seguramente em virtude do conhecimento do mandado de prisão existente contra ela.
Interrogada, a investigada alegou se recordar apenas de ter desferido três facadas no companheiro, nenhuma delas no rosto, e sustentou que apenas o fez em virtude dele ter aparecido já com a faca na mão para lhe constranger a não ir embora da residência. Apesar da grande diferença de tamanho e condição física, disse que conseguiu tomar a faca do marido na ocasião e que usou o mesmo objeto para lhe ferir. Acrescentou que tinha conflitos com o companheiro em virtude da prática de sua religião, pois ele não gostava que ela participasse de “despachos” e outras práticas, bem como confirmou que desde março suspeitava de infidelidade conjugal por parte do companheiro.
Cabe lembrar que logo após o crime a autora foi presa em flagrante e, submetida à audiência de custódia, teve sua prisão cautelar decretada a pedido da Polícia Civil. Outrossim, na ocasião, também teve cumprido um mandado de prisão vigente contra si por envolvimento na prática de um roubo morte da vítima (latrocínio) ocorrido em 2019 no Estado do Rio Grande do Sul, em virtude do qual foi definitivamente condenada pela justiça gaúcha a uma pena de mais de 15 anos de reclusão.
A vítima tinha 41 anos de idade e era natural de Santa Maria, no Estado do Rio Grande do Sul. Personal trainer e multicampeão fisiculturista, era bastante conhecido na região de Chapecó e nas redes sociais em virtude de conquistas recentes na área deste esporte.
Caso venha a ser condenada pelo Tribunal do Júri, a autora pode receber uma pena entre 12 e 30 anos de reclusão, a qual será somada à condenação preexistente. A Polícia Civil finalizará formalmente o inquérito policial nos próximos dias. (Sublinhado)
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